A Lenda das Rosas
Eis despois vem Dinis, que bem parece
Do bravo Afonso estirpe nobre e dina,
Com quem a fama grande se escurece
Da liberalidade alexandrina.
Com este o Reino próspero florece
(Alcançada já a paz áurea divina)
Em constituições, leis e costumes,
Na terra já tranquila claros lumes.
Lusíadas Canto III - 96
Pensativo estava el-rei D. Diniz, que a História chamou de Lavrador, no balcão do castelo de Sabugal, olhando os campos verdejantes que se estendiam ao alcance de sua vista.
As medidas que tomara tinham reactivado a agricultura e o pinhal que mandara plantar nos areais de Leiria travava o avanço das areias para os campos agrícolas. Dele, cantaria mais tarde em verso, Fernando Pessoa, “na noite escreve em seu cantar de amigo o plantador de naus a haver…”.
Rei culto, poeta, de sensibilidade única, amante do seu povo, doía-lhe a miséria que grassava em redor, por isso a sua governação era organizativa e de desenvolvimento e não guerreira.
Tinha desposado excelente senhora, Infanta Isabel, dama de Aragão e de mui nobre família real da Ibéria e da Sicília.
Só lhe sobrepujava a beleza e a formosura de seus gestos, a bondade e a candura do trato para com os pobres que à volta do paço estendiam a mão à caridade.
E sempre Isabel se dirigia para o seu meio distribuindo esmolas e pão. Era querida pelo povo que a chamava de rainha santa.
Incomodado estava o soberano por ver a rainha sempre no seio do povo praticando misericórdia e afastando-se do paço real, não por maldade, mas por deveres reais, porque outros deveres clamavam por sua presença.
A neblina envolvia a manhã e o sol de envergonhado se escondia no seu seio, a rainha dirigia-se vagarosamente para a saída do paço, com o regaço cheio de pães para os seus pobres, toldou-lhe o passo o esposo real que a inquiriu brandamente:
-Que levais no regaço, real senhora?
Olhar baixo, a mão procurou auxílio no crucifixo que portava ao peito, onde Jesus repousa, e uma oração iluminou-lhe o semblante e o seu redor.
Com voz cristalina e segura, respondeu:
-Rosas, senhor, são rosas!
-Rosas, retorquiu D. Diniz surpreso, Rosas em Janeiro? Mostrai-mas!
D. Isabel abriu mansamente as pregas do vestido e de seu regaço caíram rosas brancas que de frescas e perfumadas encheram o ar de santo cheiro.
Nesse dia os pobres de Santa Isabel foram alimentados com o maná dos céus e o sol mostrou-se por entre a neblina iluminando de clara luz semelhante milagre.
Foi esta senhora beatificada em 1516 e canonizada em 1625, pelo serviço prestado à misericórdia e à fé, mas, se tal não fosse feito, ficaria na memória do povo sempre como Rainha Santa Isabel, porque de humildes a gratidão perdura.
Romântico milagre que perdura nas tradições e lendas de Portugal!
Alma Lusa