Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Aquáriusul

Sou daqui deste povo que cheira a mar e sabe a fado

Aquáriusul

Sou daqui deste povo que cheira a mar e sabe a fado

Sab | 30.05.09

Tróia: o cavalo de Tróia

troia.jpg

Do passado ecoam vozes que clamam por verdade!
 
Alma Lusa
 
Ao raiar do dia a corneta do guardião da torre soou jubilosamente. Que seria aquilo? Todos ficaram impressionados. Seria alarme ou sinal de regozijo? Novamente soou a corneta, emitindo sons jubilosos cada vez mais acentuados que se espalhavam sobre a cidade. Haveria um ataque? Não viria resposta inimiga a esse som de desafio? Todos precipitaram-se às torres, escalaram telhados e muralhas. Kassandra foi uma das primeiras. O mar estava calmo e solitário; liso como espelho; livre de qualquer embarcação. Onde estariam as naus gregas? E o acampamento? Ainda podia-se ver parte das armas espalhadas: os aríetes, as pedras, as máquinas projectoras, porém, pareciam imprestáveis? O que seria aquilo na praia? Um animal gigantesco? Parecia um quadrúpede rígido; alto e desajeitado. A imagem de um cavalo grego. Kassandra sentiu-se inquieta e assustada ao avistá-lo, entretanto, os outros estavam cheios de júbilo. Os portões da cidade abriram-se e o povo saiu ao encontro do sol. Liberdade após um peso de dez anos de guerra. Um presente dos deuses!
Rejubilando, fora de si de tanta felicidade, os homens pulavam como crianças e abraçavam-se. Apenas alguns mais sensatos, entre eles, Hektor e Priamos, sacudiam a cabeça. No entanto, o povo regozijava-se de alegria. Foram até à praia e passaram pelo acampamento abandonado, onde encontraram pão e vinho em quantidade. Contentes e gratos apenas viviam o momento. Subitamente uma voz fez-se ouvir na multidão.
-Vamos levar o cavalo para dentro da fortaleza.
Escalaram-no por meio de escadas, pois era muito alto, e o enfeitaram com grinaldas de flores como a um animal que vai para o sacrifício.
Então uma voz aguda, ameaçadora, gritou da torre:
-Ai de vós! Ai de ti, Tróia! Não vos deixeis tentar; eu vos previno. Reduzi-o a cinzas.
Fez-se silêncio. Depois ergueu-se um murmúrio, um vozerio de palavras amargas, e risadas estridentes de escárnio. Depois, tudo emudeceu novamente. O animal foi colocado sobre rolos, a fim de que pudesse ser movimentado com maior facilidade.
Soou novo grito de advertência:
-Ai de ti Tróia! Eu vos previno! Queimai-o!
Priamos, por fim, ordenou que deixassem o animal onde estava; por conseguinte, o povo retirou-se para o interior da cidade, mas praguejando e amaldiçoando Kassandra.
 
O povo de Tróia movimentava-se o dia todo pelas ruas, gritando em alegre exaltação. Coros em acção de graças eram recitados nos Templos. Lançavam tochas em chamas que pareciam pássaros. Flores eram lançadas pelas janelas. A alegria era geral.
Veio a noite. Os últimos raios vermelhos de sol ainda tingiam o ocidente e o mar no horizonte. As estrelas começavam a cintilar e sobre Tróia brilhava o esplendor de fogos festivos. O povo saiu pelo grande portão, desobedecendo as ordens de Priamos e as palavras de Kassandra. Assim o povo aproximou-se da praia, onde o cavalo, todo enfeitado, esperava. Gritaram de alegria e iniciaram uma dança selvagem em torno do cavalo. Em seguida a multidão regressou à cidade lentamente, puxando o gigantesco animal. (…)
 
Excerto do livro “Histórias de Tempos Passados”, editado pela editora Ordem do Graal.
Seg | 04.05.09

Europa!

cabo de sagres.jpg

A Europa jaz, posta nos cotovelos:

De oriente a ocidente jaz, fitando,

E toldam-lhe românticos cabelos,

Olhos gregos, lembrando.

O cotovelo esquerdo é recuado;

O direito é em ângulo disposto.

Aquele diz Itália onde é pousado;

Este diz Inglaterra onde, afastado,

A mão sustenta, em que se apoia o rosto.

Fita, com olhar esfíngico e fatal,

O ocidente, futuro do passado.

O rosto com que fita é Portugal

Fernando Pessoa

 

Que legado deixaste ao mundo, Europa? A tua filosofia, a tua organização, a tua temeridade…

Com olhos gregos filosofaste e de mãos hábeis nasceu o legado da história, cérebros romanos organizaram, legislaram e construíram impérios, ao mar te fizeste com espírito lusitano e novos rumos e terras deste ao mundo…

“oh! maré nostrum, quanto do teu sal, são lágrimas dos meus olhos…”

E após, os teus filhos se espalharam pelos quatro cantos do mundo desbravando a terra que foi tua e o mar que navegaste, numa imensa teia de civilização.

Hoje, Europa, que te recolheste às tuas planícies e serranias, na beleza bucólica das tuas terras, verdes ou brancas, na multifacetada cultura que te alimenta a alma, tentas encontrar o caminho irmanando os teus povos numa união, que de natural nos separa pelos mundos que semeamos.

Que valores? Pelos tormentos e guerras passadas. Que exemplo? pela história e episódios alimentados.

Europa, quão de ti alimenta a minha alma, nascida e criada nas tuas entranhas! Clamas por teus filhos, clamas pelo teu passado que te pesa com o registo da História; ligado estou e separar-me não desejo, a terra clama por mim e de mim recebe a ligação que do passado me une. Renasce bem-aventurada mãe de heróis, portentosos guerreiros, cuja honra valia mais que a vida.

Foste cantada por poetas, filhos teus, escrita por romancistas, filhos teus, filósofos pensaram-te, filhos teus, construída por simples, homens rudes, filhos teus… que anseias hoje, Europa?

Dar novos mundos ao mundo? Já o fizeste.

Espalhar cultura? Já o fizeste?

Transmitir a fé? Já o fizeste.

Que te falta, então?

Olhar para a tua obra no mundo, que já foi teu, e pensar até que ponto és digna do que transmitiste e que culpas tens que assumir num teatro que cada vez se torna mais pequeno.

Consola-te, que no desespero da falta, não esqueças, que outros também participaram.

Europa, velha Europa, mãe de Pátrias!

 

 Alma Lusa