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Aquáriusul

Sou daqui deste povo que cheira a mar e sabe a fado

Aquáriusul

Sou daqui deste povo que cheira a mar e sabe a fado

Qui | 20.05.10

A lenda da moura de Tavira

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Por esta causa, o Reino governou

O conde bolonhês, depois alçado

Por rei, quando da vida se apartou

Seu irmão Sancho, sempre ao ócio dado.

Este, que Afonso o Bravo se chamou,

Depois de ter o reino segurado,

Em dilatá-lo cuida, que em terreno

Não cabe o altivo peito, tão pequeno.

Lusíadas          Canto III - 94

Serena era a manhã, desabrochava sobre as águas límpidas do rio que mansamente deslizavam para os braços do largo oceano. No cimo das muralhas, um vulto esbelto de mulher olhava fixamente o horizonte, onde o rio abraçava a ria, que de tão formosa seria de nome, Formosa. Os seus olhos negros denunciavam a origem moura, norte de África, terra quente. Era ela filha do Alcaide Aben Fabila, homem duro, habituado às lides da guerra e que há bem pouco tempo em contenda com os cristãos, sete cavaleiros tinham tombado às suas armas. Abeirou-se de sua filha e fitou o seu semblante triste e preocupado.

O seu arrojado empreendimento traria às portas do seu castelo o temível guerreiro cristão D. Paio Peres Correia, temido e valorizado por muitos. O sangue dos seus cavaleiros clamava da terra que era sua e as armas estavam adestradas para a contenda.

Minha filha, os cristãos em breve estarão às portas do castelo e a sua ferocidade em combate é por demais conhecida, não garanto que consigamos levar a nossa causa à vitória. As suas armas são por demais fortes e a sua causa alimenta o seu indómito espírito. Por força do meu conhecimento de feitiçaria vou encantar-te para que os cristãos a ti não possam chegar. Poderão ver-te no alto da torre de menagem, só na noite das festas do seu apóstolo, João, mas não poderão tocar-te, a não ser que, consigam escalar as pedras desta torre antes de o sol nascer. Empresa que considero impossível e pela graça de Alá, voltarei para o teu desencanto.

Ambos, em silêncio, numa comunhão espiritual de valores quedaram-se a olhar a paisagem que em breve não seria sua. Amava ele sua filha e saudoso estava de sua pátria. Os olhos marejados fixaram-se em seu pai, cujo rosto, marcado pelo tempo, denunciava a angústia e o sofrimento do momento, em sulcos vincado.

Meu pai, não te esquecerás de mim, volta e liberta-me do tormento em que vou ficar, quero rever as areias do meu País natal, o meu povo e o que me é querido, leva-me de volta para onde eu pertenço, para alegria do meu coração.

Os dias passaram e os defensores do castelo prepararam-se para a mais que certa tormenta que se avizinhava. Não precisaram esperar muito tempo e o castelo estava cercado pela tropa cristã. Reclamavam a terra que era sua e pediam alvíssaras para o rei de Portugal. A contenda ficou na memória do tempo, o castelo em mãos cristãs, e Aben Fabila… só pela morte não cumpriria a sua promessa! Nuvens passaram por cima da torre, as águas corriam para o mar, as pedras enegreciam…

Ao entardecer de certo dia, cavalgava D. Ramiro, nobre cavaleiro e valoroso em armas, para o castelo, beirando o rio e mirando os altos muros cujas ameias sobressaiam no alto da colina. Inquieto estava o seu cavalo, belo animal criado pelos campos da Lusitânia, o seu olhar rodeou a paisagem à procura de tal inquietação, o sol já se tinha recolhido e a lua peregrinava nos céus iluminando a paisagem num misto de sombras e luz. O seu olhar acompanhou a lua e quedou-se no alto da torre de menagem.

Que via ele? Um vulto de mulher, moura pelo seu trajar, límpidos olhos negros pediam auxílio, o seu coração bateu acelerado e o ímpeto levou-o a escalar as altas muralhas, que a ansiedade não lhe permitiu chegar às portas do castelo, ou fora o destino do encanto que tal ousadia criara? Mas, como tinha vaticinado Aben Fabila, a empresa prometia dificuldades e insucesso no seu empreendimento. Corajosamente e com os olhos postos na bela moura, cuja tristeza assim o encorajava, D. Ramiro trepava pedra a pedra subindo pela torre que parecia não ter fim… e não tinha! O tempo passou, a lua circulava pelos céus e iniciou o seu declínio, o vislumbre do amanhecer espreitou entre as serras no horizonte e as nuvens pararam em cima da torre cobrindo a bela moura, cujo olhar se encheu de lágrimas contemplando o arrojado cavaleiro que triste e surpreso via a bela mulher desaparecer para mais um ciclo do seu encanto, desespero e angústia alimentou o espírito do jovem cavaleiro.

Tornou-se D. Ramiro bravo no campo de batalha, desbaratando as hordas de mouros que contra si pelejavam, castelo após castelo caiam às suas armas, mas a bela moura, essa, alimentou o seu encanto e o seu amor nas entranhas do seu ser… Lenda que perdura nas tradições e lendas de Portugal.

 

Alma Lusa

Sab | 08.05.10

Verdes são os campos

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Verdes são os campos,

De cor de limão;

Assim são os olhos

Do meu coração.

 

Campo, que te estendes

Com verdura bela;

Ovelhas, que nela

Vosso pasto tendes,

De ervas vos mantendes

Que traz o Verão,

E eu das lembranças

Do meu coração.

Gados que pasceis

Com contentamento,

Vosso mantimento

Não no entendereis;

Isso que comeis

Não são ervas, não:

São graças dos olhos do meu coração.

 

Luís Vaz de Camões

 

Esta redondilha é interpretada musicalmente por José Afonso.